Lembrancinha de pés pequenos

segunda-feira, 6 de junho de 2011

por Wanderson Duque

Quando conheci Hosana, meu primo Ramon já havia entrado no ônibus com um embrulho no bolso esquerdo do short camurça, que seria o motivo pelo qual ele levaria uma facada no braço por se recusar a entregá-lo a um assaltante, e eu era banhado pela garoa finíssima e a noite assustadora que abraçava Comendador Soares com o ímpeto de Saladino.

Ramon me deixou no ponto de ônibus desprovido de qualquer cobertura, enquanto eu pensava na possibilidade de ter tomado, junto com ele, aquela condução. O frio castigou o corpo até o momento que Jéssica e Giuseppe me presentearam com a sensação anestésica que foi contemplar o sorriso de Hosana, que se abriu gentilmente a mim como um botão de rosa. Uma menina tão branca quanto o leite em pó que eu misturava ao achocolatado Nescau nas manhãs cheias de dúvidas sobre minha decisão de fugir da casa de meus pais e ir morar com minha tia Lúcia. O rosto cheio de pintinhas lhe atribuía uma beleza a mais.

Seu nome ecoou na minha cabeça durante toda a noite. No dia seguinte, meu arquivo mental se abriu como um leque, e pude-me ver correndo no pátio de cimento batido e empoeirado da escola onde cursava o Jardim da Infância, gritando seu nome por causa de alguma brincadeira desses tempos pueris. Foi a primeira de muitas noites que passei acordado com o pensamento fixo na lembrança da beleza de seu carisma incontido e de seus pés pequenos.

 
 
 
 
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